Um dia destes estava a ver o Quem Quer Ser Milionário e há uma pergunta sobre a data do Tratado de Tordesilhas. Ponho-me a pensar naquilo – no tratado, não na data – e penso que os Espanhóis já deviam ter espreitado qualquer coisa lá para o ocidente. Isto de ficar com uma parte do mundo sem saber o que lá havia, ou sequer se havia alguma coisa, é de estranhar. Ainda para mais assinando a coisa em casa. Mas adiante…

Fico a pensar nisto e no que, passados 500 anos, conseguimos tirar dos descobrimentos. De termos ido com naus e caravelas até ao cu de Judas. Algo que realmente marque a nossa cultura no mundo.

Fala-se em pontos fortes de Portugal e ouve-se logo “os turistas adoram a nossa cozinha.” É verdade. Mas isso é se forem aventureiros ou se alguém lhes tiver dado umas dicas. Não é raro ver turistas no Algarve a comer pizzas e hamburgers, com tanta coisa boa mesmo ao lado.

Mas sim, peguemos no exemplo da comida. Basta ver os canais de TV dedicados ao tema. Há algum chef internacional que use chouriço? Não! O que eles usam é chorizo, o espanhol. Apesar de termos uma oferta de enchidos bem mais rica, ninguém fora de portas a conhece. Farinheira? Cá usam e deram em fazer “crocante de farinheira” para acompanhar tudo e mais alguma coisa. Lá fora não existe. O presunto é prosciutto. Já viram alguém a fazer leite creme? Não. É sempre a porra do crème brûlée. Até podem usar o fígado de porco mas o resultado, pelo menos visualmente, parece ficar a anos-luz de umas iscas à portuguesa. Doçaria conventual? Nem vê-la. Podem usar o “olivóile”, mas é sempre algo que vem de Itália ou Grécia. Bacalhau? Sim, mas não do nosso (mesmo que não seja mesmo nosso).

É tudo muito bom quando é mostrado na TV. Os grandes planos dos pratos tornam algo banal numa iguaria. Mas quando toca ao sabor, metam um chefe português no meio daqueles concursos e vão ver o resultado. Têm dúvidas? Vejam o exemplo da Luísa Fernandes no Chopped. Chegou, foi ignorada pelos outros concorrentes e deu-lhes um valente pontapé no rabo. Mas mesmo ali se nota a falta de força da gastronomia portuguesa no mundo. Na primeira prova a Luísa fez um gaspacho e o que apareceu foi “gazpacho”.

Outro exemplo é a ‘food truck’ Portu-Galo, nos EUA onde tudo faz sucesso. Até o prego no pão.

Mas fale-se a alguém de fora num prego no pão, ou numa beef sandwich, e a resposta vai ser “hein?” Será que há alguma coisa nossa que tenha deixado uma verdadeira marca lá fora? Sim. O frango assado!

Todos os anos os chefes carregados de estrelas Michelin juntam-se na Quinta do Lago para eventos gastronómicos disto e daquilo. E o que vão eles comer? Frango da Guia. Lá fora o Senhor Fernando fez fortuna com o Nando’s, a sua cadeia de peri-peri chicken.

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E até mais recentemente, num Masterchef Austrália que passou por cá, se pode ver este fenómeno do frango. Estava por lá uma portuguesa – a Cristina – e numa prova de equipa tinham de fazer, entre outras coisas, frango. Quem ficou encarregue do frango? A portuguesa. Mas porque sugeriu? Não! Porque a nomearam logo para isso. Na hora de provar, lá estão os jurados a destacar o frango: “portuguese chicken is so good”. Claro que a Cristina diz que a cozinha portuguesa não é só frango, mas eles querem lá saber.

Depois de termos feito tanto pelo mundo durante os descobrimentos, a grande marca que deixámos foi o frango. E o piri-piri, que veio de África.